É preciso comprovação de dolo para a tipificação do crime de poluição omissiva. Por não observar essa intenção nos réus, o juiz Thiago de Mattos Cardozo, da 2ª Vara Federal de Volta Redonda (RJ), absolveu a Companhia Siderúrgica Nacional e cinco diretores.
A ação penal trata de um dos maiores casos ambientais do Rio de Janeiro: a contaminação de uma área próxima ao rio Paraíba, prejudicando o abastecimento de pelo menos 2.200 residências no município de Volta Redonda.
Atuaram no caso os advogados Bruno Salles Pereira Ribeiro, do escritório Cavalcante, Sion e Salles Advogados, e Luís Carlos Dias Torres, do escritório Torres, Flavigna e Vainer Advogados. Os réus foram denunciados pelo Ministério Público pela prática prevista no artigo 53 do parágrafo 3º da Lei 9.605/1998: deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível.
Assim, o processo não discutiu a poluição ou o dano ambiental, sua extensão, causas ou consequências, mas se ocorreu o descumprimento doloso por parte dos réus de determinações emanadas pela autoridade administrativa. Os réus teriam descumprido quatro notificações do Instituto Estadual do Ambiente (Inea).
Ocorre que o mesmo tema foi levado ao Judiciário pelo Ministério Público por ação civil pública, em que o juízo indeferiu pedido de antecipação dos efeitos da tutela, no sentido de desobrigar a ré CSN e os demais réus a adotarem, em caráter de urgência, as medidas apontadas como descumpridas.
Portanto, entendeu o juízo federal, os réus agiram — ou deixaram de agir — amparados em decisão judicial, apesar de o MPF argumentar que exista a independência das instâncias administrativa, cível e penal, e que os requisitos autorizadores para a medida liminar requerida sejam diferentes dos requisitos para configurar a materialidade formal e material do crime imputado.
“Tal pretensão do Ministério Público Federal poderia gerar uma incongruência sistemática do sistema de justiça, vilipendiando até mesmo a necessária confiança dos jurisdicionados nas decisões emanadas pelo Poder Judiciário. Os réus deixam de cumprir as determinações administrativas escorados em uma decisão judicial e mesmo assim seriam criminalizados por não cumpri-las?”, indaga o juiz Thiago de Mattos Cardozo.
Assim, o MPF não comprovou que a conduta dos réus se caracterizou como exercício abusivo de defesa, com intuito meramente protelatório. A decisão ainda descarta o entendimento de que o descumprimento das notificações do Inea só seria possível a partir de impugnação judicial ou adminstrativa das mesmas.
“Não é possível, por si só, criminalizar pela poluição omissiva um particular que deixa de impugnar a ordem administrativa nos moldes do previsto em legislação que normatiza o processo administrativo estadual sob pena de não observar o princípio da fragmentariedade do direito penal”, explicou.
O juiz ainda destacou a complexidade exigida no cumprimento de cada uma das determinações.
Clique aqui para ler a decisão
AP 0500121-31.2016.4.02.5104
Este artigo foi originalmente publicado em https://www.conjur.com.br/2020-mar-20/juiz-rj-absolve-csn-diretores-crime-ambiental por Danilo Vital.